Postado em 31/05/2021 01:42 - Edição: Bruno Wisniewski
Estamos vivenciando momentos complicados com relação à pandemia da Covid-19 e seus desdobramentos sociais. Embora as informações sobre a importância das medidas de prevenção (como a higienização constante e o distanciamento social) sejam amplamente divulgadas, não se verifica uma redução significativa do número de contágios e óbitos no país, fazendo com que a necessidade do isolamento se estenda por um longo período. No entanto, é importante considerar que, ainda que fortemente recomendadas, as ações preventivas não são possibilidades concretas para muitas pessoas.
A População em Situação de Rua (PSR), devido a sua vulnerabilidade, carece muitas vezes de condições básicas para o cumprimento dessas recomendações. Certamente não há como praticar o isolamento sem residência, e produtos como o álcool em gel não são de fácil acesso a essa população.
Além disso, o acesso à higiene e mesmo à água pode se tornar um desafio na situação de rua. Em Curitiba, por exemplo, não existem banheiros ou mesmo torneiras públicas de acesso gratuito, o que afeta não só a PSR, mas também todas as pessoas que se encontram nos logradouros públicos. Desta forma, é necessário pensar nesta população e no seu acesso à saúde básica.
Mesmo com tanto tempo de pandemia, o poder público ainda não apresentou medidas de proteção e segurança efetiva da PSR. Não há segurança alguma de acesso às condições de higiene necessárias para o enfrentamento à pandemia, tampouco de segurança alimentar, o que torna esse grupo mais vulnerável em termos de capacidade imunológica à doença, e também de acesso à moradia, sobretudo aos grupos de risco que se encontram em situação de rua – como pessoas idosas, que deveriam, de acordo com a Portaria nº 188/2020, do Ministério da Saúde, ser mantidas em isolamento social.
Levando em conta todo esse cenário e reflexões importantes neste dia de luta, reunimos algumas considerações sobre a atuação de Psicólogas(os) junto a esta população.
É importante que a(o) Psicóloga(o) que trabalha em contato direto ou indireto com a PSR tenha consciência de sua condição ainda mais fragilizada durante a pandemia, uma vez que esta geralmente é a primeira população a perder o já escasso acesso aos serviços básicos. Tendo isso em mente, é de grande importância a manutenção dos serviços destinados a essa população, orientando-a a partir do exposto na Política Nacional para a PSR (Decreto Presidencial nº 7.053/2009), e atentando-se para os cuidados necessários quanto às condições de atendimento, em especial em ambientes fechados (circulação de ar, higienização, distanciamento).
É necessário que haja álcool em gel de fácil acesso às pessoas atendidas, possibilitando a higienização das mãos, assim como a limpeza de locais e utensílios de uso coletivo, como, por exemplo, cadeiras, canetas e maçanetas. O contato físico vem sendo evitado entre todas as pessoas; porém, a razão para a ausência mesmo de um contato mínimo (como um aperto de mão) deve ser explicada pela(o) professional, pois a pessoa em situação de rua pode não ter a compreensão dos motivos para atitude – muitas pessoas já se esquivavam de qualquer contato com essa população mesmo antes da pandemia, de forma discriminatória. Outro cuidado a se tomar é a não reprodução de preconceitos relacionados a questões de higiene, devendo as explicações acontecerem sem um caráter moral, de julgamento. É importante que esta atitude de promoção de saúde não atue contra o vínculo de confiança com essa população.
Com a finalidade de evitar a concentração de pessoas em espaços de espera, é interessante aumentar o tempo de intervalo entre atendimentos, diminuindo a permanência das pessoas nestes espaços. Preferir, também, para atividades em grupo necessárias, locais com circulação de ar e a possibilidade de que as(os) participantes mantenham uma distância mínima de um metro uns dos outros.
Ainda se faz importante, sempre que possível: colocar informativos com relação à doença e higienização básica; promover atividades informativas para esta população, permitindo que ela tire suas dúvidas e ensinando protocolos de higienização das mãos, produtos e locais que podem ser utilizados, principalmente levando em consideração o acesso limitado desta população com relação a alguns recursos; desmitificar temas com relação à esterilização tanto das mãos quanto de outros objetos, e informar sobre a importância de não compartilhar talheres, copos e pratos, ou mesmo alimentos.
Em casos de serviços de caráter voluntário, as recomendações se mantêm as mesmas, pensando sempre na segurança de todas as pessoas que participam do processo de trabalho. Em caso de campanhas de doação, é importante ter fácil acesso ao álcool em gel, assim como o uso de máscara.
Nós, Psicólogas(os), temos muito a contribuir com a sociedade e com a PSR neste momento. A atenção redobrada e o isolamento ainda se fazem necessários, o que pode causar medo e desinformação. É importante que nós, como profissionais, atuemos justamente na desambiguação dessas informações, auxiliando e instruindo as pessoas nos nossos locais de atuação de forma assertiva e objetiva. Que atuemos no enfrentamento ao medo que a situação ocasiona, mas, principalmente, que este isolamento momentâneo não deixe ainda mais distantes aqueles que já costumam estar isolados na multidão.
Ainda no contexto das desproteções às quais as pessoas em situação de rua são submetidas, configura-se como risco a seus direitos básicos de cidadania o enfraquecimento dos serviços públicos de saúde e assistência social frente o avanço das medidas de isolamento como resposta do poder público aos problemas sociais enfrentados por essa população. Nesse sentido, o Movimento Nacional de População em Situação de Rua (MNPR) lançou o manifesto 10 Motivos Contrários à Atuação das Comunidades Terapêuticas junto à População em Situação de Rua, do qual o CRP-PR é signatário.
https://docs.google.com/document/d/1K4RABg1s8U6MXtmV5NeZjA0jX8xR6iS0btBZO1Li92o/edit
Ref.: http://crppr.org.br/